domingo, 17 de novembro de 2013

Um pouco sobre a história desse teatro

Grupo voltado para o teatro político. Adapta textos clássicos e cria dramaturgia própria com o objetivo de criticar os problemas da sociedade contemporânea.
O Folias d'Arte se forma em 1997, quando um grupo de artistas paulistas recebe o Prêmio Estímulo Flávio Rangel, do governo do Estado de São Paulo, para produzir a montagem do espetáculo Folias Fellinianas, texto inspirado na atmosfera onírica do cineasta italiano Federico Fellini. Diante da necessidade de escolher um nome para o grupo, o título da peça parece a seus fundadores uma boa inspiração, capaz de representar a proposta de unir o erudito, representado na expressão "d'arte", e o popular, nos cantos, nas danças e na irreverência das folias de rua. Na fundação os integrantes do Folias são Reinaldo Maia, autor do texto, os atores Renata Zhanetta, Rogério Bandeira, Carlos Francisco, Nani de Oliveira e Patrícia Barros, além de Marco Antonio Rodrigues, diretor do espetáculo.

Em busca de um local de ensaios para Folias Fellinianas, o grupo encontra no bairro de Santa Cecília, em São Paulo, um galpão abandonado, propriedade da Fundação Conrado Wessel, que cede o espaço sem ônus de aluguel por dois anos. O espetáculo estreia no Teatro Aliança Francesa em outubro de 1998, ano em que o grupo recebe o Prêmio Mambembe.
A necessidade de ter um espaço próprio, que permitisse autonomia de programação e administração, leva o grupo a investir na transformação do galpão de ensaios em sala de espetáculo. Para isso, conta com a ajuda da Fundação Wessel, que fornece material e mão de obra da engenharia civil, e do cenógrafo J. C. Serroni, que oferece o projeto arquitetônico gratuitamente.
Depois de dois anos de trabalho na reforma, o Galpão do Folias é oficialmente inaugurado em 2000 com Happy End, texto de Elizabeth Hauptmann e músicas de Bertolt Brecht e Kurt Weill, em coprodução com o Grupo TAPAMusical em clima de cabaré, conta o embate entre gângsteres e religiosos na Chicago dos anos 1930, período tumultuado da lei seca e do crack da Bolsa de Nova York, que, segundo o diretor Marco Antonio Rodrigues, guarda relação com o cenário mundial do fim do século XX na forma como os poderes políticos, religiosos e empresariais se relacionam, corroborando "a cultura da mediocrização e a consequente violência".1
A partir de 1999, o Folias torna-se um dos líderes do movimento Arte contra a Barbárie, que condena a mercantilização da cultura e propõe a criação de mecanismos estáveis de fomento à pesquisa e à experimentação, assim como políticas públicas que promovam maior acesso do público aos espetáculos. A repercussão do movimento resulta na aprovação da Lei de Fomento ao Teatro do Município de São Paulo.

A luta por políticas públicas para a arte e a cultura faz parte do ideário do grupo, que participa também das discussões para a criação do Fundo Estadual de Arte e Cultura e do Prêmio Teatro Brasileiro, e está envolvido, com mais dez grupos da cidade, em reflexões e análises sobre a criação estética com base na prática e na perspectiva do teatro de grupo.
Para o diretor Marco Antonio Rodrigues, a escolha do tema para um espetáculo nasce sempre de uma questão que os angustia como artistas. "Acreditamos que, se levantamos um problema legítimo, ele diz respeito a nossos contemporâneos, e que portanto a comunicação entre palco e espectadores se constituirá de forma concreta".2
Em 2003, o Folias realiza sua primeira montagem de um texto de William Shakespeare. A releitura de Otelo, segundo Marco Antonio Rodrigues, é mais uma tragédia sobre a propriedade do que sobre o ciúme, em que a Veneza do século XVI se funde com a Nova York do século XXI. Para a professora e pesquisadora de literatura inglesa Célia Arns de Miranda, o espetáculo resulta em "uma incessante e recíproca interação do sagrado e do profano, da arte erudita e popular, da linearidade clássica e da fragmentação do pensamento, do humanismo renascentista e da modernidade asfixiante".3 Essa peça recebe, em 2003, o Prêmio Shell de direção e cenografia, e o Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA) de melhor espetáculo do ano.
Para comemorar os dez anos de existência, o grupo monta Oréstia, o Canto do Bode, adaptação de Reinaldo Maia para a trilogia de Ésquilo, constituída pelas tragédiasAgamênonCoéforas e Eumênides, que, juntas, tratam da formação do estado democrático grego, em que se dá a passagem da justiça baseada na vingança para a justiça do mundo civilizado. A adaptação do Folias traça um paralelo com a constituição do continente latino-americano e aborda, na primeira peça, o populismo dos anos 1950 e 1960; na segunda, a ditadura dos anos 1970 e 1980; e na terceira, a redemocratização a partir das últimas décadas do século XX. 
A montagem comemorativa do 10º aniversário coincide com o décimo número dosCadernos do Folias, revista lançada pelo grupo em junho de 2000, com ensaios, entrevistas e textos do repertório dos grupos teatrais de São Paulo. Além dos Cadernos, o grupo publica livros, oferece oficinas e leituras de textos teatrais, organiza seminários e debates públicos. Sempre buscando a troca de experiências, o Folias estabelece um convênio com a Escola Superior de Coimbra, em Portugal, mantém estreitas relações com a Academia Russa de Arte Teatral e é parceiro do Teatro-Escola Célia Helena, de São Paulo, em várias iniciativas.
Em maio de 2008, no Galpão do Folias, é lançado o livro Verás que Tudo É Verdade, de Jorge Louraço Figueira, dramaturgo e crítico de teatro português, que "descreve a trajetória de um punhado de aventureiros que, a bordo de um galpão, impõem a arte teatral como experiência do real".4
Em dezembro do mesmo ano, o Folias lança o filme Ao Pé de Cecília Santa, dirigido pelo também ator Zeca Rodrigues. O documentário acompanha o percurso artístico e político do grupo na região da cidade onde está sua sede, o bairro de Santa Cecília.
Para manter a estrutura do galpão, o grupo promove uma campanha para conquistar sócios e parceiros, que têm, em troca, o direito de assistir seus espetáculos e participar de suas atividades. Porque, de acordo com a concepção de seus criadores, o Galpão do Folias não é fundado apenas para ser sede do grupo, mas também instrumento de revitalização do espaço urbano, levando sua produção à população e convidando-a a se apropriar do espaço, que "nasceu para ser público".5 Supervisionado por um conselho artístico que avalia o conteúdo ideológico e estético dos projetos, o grupo conta com mais de trinta "foliões", em 2009.

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